Conciliar noites mal dormidas com a produção científica não é simples, Mas para Taisa Calvette, a maternidade não foi obstáculo; ela defendeu a tese de doutorado na FGV EMAp em dezembro, com a caçula já no colo
Taisa é mãe de duas meninas: “Elas terão orgulho, principalmente por eu nunca ter deixado de estar com elas” | Imagem: Arquivo pessoal
Assim como um filho não vem com manual de instruções, a trajetória acadêmica de Taisa Dornelas Abbas Calvette também não seguiu um roteiro previsível e foi escrita entre fraldas, fórmulas e defesas. Economista de formação, ela deixou que seus interesses e necessidades profissionais a conduzissem por diferentes áreas. Após dois mestrados, Taisa chegou à Escola de Matemática Aplicada da Fundação Getulio Vargas (FGV EMAp) em busca de um doutorado multidisciplinar. Grávida pela segunda vez, conciliou a gestação com a pesquisa e descobriu que a maternidade, longe de ser um obstáculo, a fez ser uma pesquisadora mais objetiva e focada.
“Sempre quis ser mãe e sempre quis ser pesquisadora. Calhou dessas coisas acontecerem ao mesmo tempo. Eu não queria abrir mão de nenhum dos dois, então tentei achar uma forma de integrar”, conta.
A primeira filha, Olívia, hoje com sete anos, nasceu enquanto Taisa cursava disciplinas do mestrado em Engenharia Elétrica. O parto foi complicado: ela teve eclâmpsia e síndrome de HELLP, passou dias na UTI e a bebê nasceu prematura. Mesmo assim, seguiu adiante com os estudos. “Eu não era da engenharia, então já era um desafio acompanhar as disciplinas. Viver tudo aquilo ao mesmo tempo foi exaustivo, mas me mostrou o quanto eu era capaz”, relembra.
Anos depois, já durante o doutorado, veio a segunda gestação, da pequena Lara, hoje com dois anos e meio. “Apresentei a banca de qualificação com quase oito meses de gravidez”, lembra Taisa.
Com a experiência da primeira gestação, que envolveu complicações e os desafios naturais de ser mãe pela primeira vez, Taisa optou por um retorno mais cuidadoso após o segundo parto. “Na primeira, com três meses eu já estava de volta às aulas, ainda no meio do turbilhão. Dessa vez, me preparei melhor, sabia o que poderia acontecer e respeitei mais o meu tempo. Esperei alguns meses depois do parto para retomar a pesquisa”, conta.
Natural de Belo Horizonte-MG e morando no Rio de Janeiro há 15 anos, Taisa dividia com o marido a rotina de cuidados com as filhas durante toda a pós-graduação. Quando surgiam imprevistos mais sérios, como quando uma das meninas ficou doente, ela recorria à mãe. “Nessas horas, ela vinha e ficava uma ou duas semanas para ajudar. Mas no dia a dia, a responsabilidade era toda nossa”, conta.
“No fundo, a maternidade desafia a lógica da produtividade linear e convida a ciência a dialogar com a vida como ela é”, defende Taisa | Imagem: Arquivo pessoal
Apesar da rotina intensa, ela defendeu sua tese em dezembro de 2024, sob orientação do professor Yuri Saporito. O trabalho, intitulado Essays on Optimal Emissions Control and Environmental Policy under Stochastic Dynamics, teve como foco a modelagem matemática do tempo ótimo para implementação de políticas ambientais, com ênfase em estratégias como o carbon capture and storage (CCS). A pesquisa analisou como esse tipo de tecnologia pode postergar decisões mais estruturais e definitivas no combate às mudanças climáticas, além de empregar redes neurais para resolver sistemas de equações diferenciais voltados à trajetória de neutralização de carbono, o chamado Net Zero.
“A maternidade me ensinou a ser objetiva. Se eu tinha duas horas livres, era o tempo que eu tinha para produzir. Aproveitava o tempo da soneca das crianças, abria mão de coisas como ver filmes, e mantinha o foco total”, comenta.
Além de ser focada, a pesquisadora alega que contou com o acolhimento e a compreensão do professor Yuri: “Ele virou um amigo. A esposa dele também estava grávida, então dividimos experiências parecidas. Sem o apoio dele e do meu orientador no mestrado, que também era pai, nada disso seria possível”.
Logo após concluir o doutorado, Taisa já assumiu um novo desafio, atuando na área de pesquisa e desenvolvimento de uma empresa do setor de petróleo, onde aplica os conhecimentos adquiridos ao longo da trajetória acadêmica. Embora não tenha seguido na docência, acredita que sua história pode inspirar outras mulheres que buscam conciliar a carreira acadêmica e a maternidade: “Acho que minha história mostra que é possível. Difícil, sim. Mas possível. A maternidade e a ciência não precisam se anular. Hoje, me sinto mais inteira, como mãe e como profissional”.
Para Taisa, a experiência de ser mãe transformou também sua maneira de fazer ciência: “A maternidade amplia o olhar, faz com que a gente pense em temas que antes talvez passassem despercebidos. Ela traz outras urgências, outras sensibilidades. Isso influencia não só os assuntos que escolhemos estudar, mas também a forma como conduzimos a pesquisa, com mais empatia, mais consciência do tempo e dos limites reais da vida”.
“Quando apertava, ele sempre perguntava: ‘Vamos lá, como é que tá aí? Tá precisando de alguma coisa?’”, lembra Taisa sobre o acolhimento do orientador, professor Yuri Saporito | Imagem: Arquivo pessoal